terça-feira, 7 de maio de 2013

Paulo Britto

Sempre me lembro dessas poesias que li na faculdade e mexeram de verdade comigo.. então hoje, relendo mais uma vez, resolvi compartilhar. Acho que nunca postei-as aqui..

DEZ SONETOS SENTIMENTAIS
VII

A consistência exata dessa insônia,
a forma certa desse medo, o gesto
seco que rejeita essa necessidade
abjeta de se ser quem não se é -
a aceitação completa da vontade
insuportável de querer o que
se quer, a sede obscena de se tragar
o copo junto com a bebida - coisas
tão simples, que só pedem a paciência
sábia dos que aprenderam a se aturar,
a santa complacência de quem lambe
as próprias chagas e aprecia o gosto -
não por requinte de nojo, mas só
por nunca haver provado outro sabor.

DUAS BAGATELAS

I
O que conheço de mim
é quase só o que sei,
e o que sei é quase só
o que não quero saber.
resta saber se isso tudo
é só o começo ou se é o fim
ou - o que é pior que tudo -
se é tudo.

II
Então viver é isso,
é essa obrigação de ser feliz
a todo custo, mesmo que doa,
de amar alguma coisa, qualquer coisa,
uma causa, um corpo, o papel
em que se escreve,
a mão, a caneta até,
amar até a negação de amar,
mesmo que doa,
então viver é só
esse compromisso com a coisa,
esse contrato, esse cálculo
exato e preciso, esse vício,
só isso.

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