quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Sra. Otário-idiota

O cara só pode ser um otário. Ou não teria postado aquela foto idiota dele comendo uma porra de um macarrão gourmet que ele mesmo cozinhou, tomando um vinho com notas de sei lá que merda e que deixou ele com uma cara de idiota! Mais que o usual.

E o pior é que eu tive uma foto deste mesmo otário-idiota na cabeceira da minha cama, durante anos. ANOS! De um lado a foto de nós dois sorrindo e do outro o próprio otário. E eu achava que era feliz. Eu, a senhora otário-idiota. Talvez eu até tenha sido mesmo, eu achei que sim. Até o dia que... Ninguém acreditou na época, mas eu sei a verdade.

A gente jogou coisas pela janela, enquanto mandava o outro tomar no cú, ou ir à merda, coisas assim... Eu joguei copos, ele jogou discos, e por sorte ninguém passava pela rua naquela hora. Eu saí andando... e encontrei aquela mesma moça na praça. Ela estava ao celular, acho que falava com Deus. Ela sempre estava ali, pedindo cigarro pra quem passava, ou falando no celular que deve ter pegado em algum lixo.

O fato é que naquele dia, naquele instante, eu percebi que eu estava apaixonada por ela. Alguma coisa mágica aconteceu naquele dia específico, que eu entendi que ela era quem poderia me tornar um ser humano completo, total. Andaríamos juntas livres pelo mundo, parando quando desse vontade, se desse vontade. Sem rumo. Sem nada.

Principalmente, eu não queria nunca mais ter tapete. Eu sempre olhava pros tapetes da minha casa e pensava como eu tinha chegado ao ponto de ter tapete em casa? Quando eu parei de precisar apenas do essencial? Era irritante olhar pros tapetes, muito irritante. Triste até.

Eu só não queria mais sentar naquele mesmo bar, com aqueles mesmos idiotas, ouvindo aquelas mesmas merdas machistas, aguentando o otário-idiota em questão, ou qualquer outro. Não queria mais ouvir aqueles mesmos discos com aqueles mesmos amigos meus e do otário-idiota. Eu sei que eu queria deixar as coisas saírem de mim, as vontades nascerem de mim... e parar de querer o que eu não quero de fato.

Eu me sentei ao seu lado e disse: é com Deus que você está falando? Ela olhou assustada para mim e respondeu: por que você está falando comigo? Quem é você? Eu sou uma idiota aí... e eu te acho linda. Ela gargalhou de forma que me deu medo. Você é louca, isso sim. Sai fora, vai trabalhar! Não posso. Eu não quero mais fazer nada do que eu fiz até hoje. E você quer fazer o que? Fugir com você. Ser livre.


Livre? Você disse que era idiota e eu vou ter que concordar. Me dá 10 reais pra eu comprar uma pedra!? Anda logo! Mas eu não tenho nada, saí sem nada de casa, depois de brigar com... Cala a boca caralho, eu vou te furar se você não me der dinheiro, sua puta. Mas, a gente deveria fugir juntas, eu te amo. Sua otária. Vai se fuder e me deixa em paz! Ela saiu andando.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

euGuimarãesemeuavô

Meu avô é uma memória que fica ali, naquela caixinha de todas as alegrias da minha infância.
Hoje é aniversário de seu nascimento, e eu só posso ficar feliz por ter tido o melhor avô do mundo, porque era isso que ele era: o avô mais lindo, mais forte, mais amoroso, e que tinha pernas bastante peludas só pra eu poder brincar de puxar os pelinhos enquanto estava sentada em seu colo conversando com ele na cozinha, de tardezinha... até o anoitecer.

Meu avô conheceu o Guimarães Rosa... e um dia eu soube disso ao abrir um livro que o autor tinha autografado para ele, com um recado carinhoso. Era o Terceiras estórias... meu amor aumentou mais, minha admiração aumentou mais, e também meu desejo de que agora eu pudesse, já adulta, sentar com meu avô para dividir uma cerveja e escutar todas as suas estórias com Guimarães.

Esses dois homens que eu amo um dia sentaram e tomaram uma cerveja, talvez outra coisa, conversando sobre a vida, sobre literatura? Ou será sobre o que falaram?... Eu nunca saberei os segredos que compartilharam... e isso não posso mudar. Amargo o sabor da frustração.

Meu avô era quem me incentivava a dançar, uma grande paixão minha. Hoje eu gosto ainda mais é de escrever, aliás, já gostava das duas coisas quando a gente convivia... mas hoje eu queria saber das estórias deles dois... e queria que eles dois soubessem das minhas estórias, e que a gente conversasse sobre a vida e sobre literatura e sobre amores e desamores... e pudéssemos chorar juntos, sorrir juntos e quem sabe até dançar... euGuimarãesemeuavô.

Eu ia me sentir muito importante e quem sabe até acreditasse que eu sei escrever, não como Guimarães, claro que não. Mas como uma admiradora que gostaria de poder me contagiar das palavras daqueles dois homens que eu amo e que um dia estiveram na mesma sala, e ficaram amigos. Amigos será? Amigos, cúmplices!

Eu me lembro de conversar coisas muito importantes com meu avô, sobre o amor por exemplo. E de ler estórias belíssimas de Guimarães... mas os dois juntos?! Só nos meus sonhos posso viver esse encontro. Em meus delírios de escritora e bailarina... Eu dançaria pro meu avô e pra João, seu amigo. Uma música argentina, um tango... e então dançaria com um, e depois com o outro. E depois escreveria a mais bela estória de amor da minha vida.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Porque não sei desenhar

Fecha os olhos! Agora tenta imaginar o que eu estou vendo... Essa moça esta andando na rua, no centro de São Paulo, com um cabelo longo e liso e um vestido azul-claro longo, de tecido bem leve, que se movimenta muito mais do que ela, que nesse momento se arrepiou, mais de medo do que pelo frescor da brisa.

Ela começou a chorar. Ela andava meio sem rumo, sem se lembrar do seu nome... Ela só sentia um desejo por ver um rosto específico, do qual se lembrava muito bem, no meio daquela multidão disforme, difusa e rápida.

Sentia um cheiro de rosas, mas que se misturava ao de mijo que subia das ruas, dos becos por onde agora estava.

Não parecia ter a menor importância o nome de nada, nem mesmo daquela figura que insistia na memória dela. Mas as formas e os cheiros eram a única realidade interessante para ela, que sentia vontade e girava, em êxtase com aquele odor misto, com as emoções que a faziam então chorar e querer virar uma pomba.

Uma pomba? Que desejo absurdo! Devia querer ser uma ave mais nobre. Mas não, ela queria ser uma pomba e ganhar migalhas de pão de todos aqueles passantes... de todos os tipos de homens, mulheres e crianças.

É isso, ela era eclética, era livre, e queria se doar e receber de todos e qualquer um que quisessem usufruir do seu existir. Sentia-se sensual, e girava enquanto grunhia como aquelas pombas ao seu redor. Talvez ela quisesse ser uma pomba branca, pela simbologia da paz.. e acalmar, por isso, os desejos sexuais que a estavam tomando cada vez mais. Ela era toda tesão naquele momento, e queria engolir o ar, o mundo, os cheiros... queria engolir as pessoas, sentir seus gostos de suor, tesão e frustração. Queria engolir tudo. E quando se sentisse satisfeita ela iria implodir, e libertar a eles todos de uma só vez.

Libertá-los de sua estupidez, de sua ignorância, da arrogância que ela própria sente por, apesar de ser uma idiota, ainda se saber tão melhor que a maior parte das pessoas que passam por ela diariamente. Seus malditos! Seus... seus... seres humanos desprezíveis! Que eu quero foder! Todos! E ao menos sentir o gosto da carne, do sangue que derramam cotidianamente.

Se ao menos eu soubesse desenhar, faria lindas ilustrações do mundo que imagino quando tenho esperanças. Mas não sei desenhar... então apenas vomito no papel palavras, e peço a você, leitor medíocre, que visualize meu mundo tão vulgar, e escroto.

Mas queria saber desenhar fadas, nuvens, carros voadores, sei lá... se eu soubesse desenhar eu saberia o que é bonito de se criar. Mas eu não sei. Eu sou só esse bosta, que finge ser uma fada de vestido azul esvoaçante e pede que você, leitor, seja capaz de desenhar mentalmente o que não posso pôr no papel. Obrigada.

Seu bosta! Bosta que deve ser muito mais feliz que eu. Bosta que não deve feder como eu. Bosta que outros querem comer, mas eu quero esfregar na minha cara e me olhar no espelho. Pra ver se me sinto melhor.